Investigador Adinei Brochi seguiu por duas décadas pistas de Lúcia Weisz, acusada de mandar matar o marido em 1995. |
O
investigador da Polícia Civil Adinei Brochi, de 50 anos, seguiu durante 21 anos
uma condenada de ter mandado matar o marido até voltar a prendê-la no último
dia 5, em Ponta Grossa, no Paraná. Ele não esquece o momento em que foi
reconhecido pela foragida, mesmo após tanto tempo. “O semblante dela desabou e
ela me disse: ‘o senhor está um pouco diferente daquele policial que me
atormenta em todos os meus pesadelos’.”
A foragida
Lúcia de Fátima Dutra Weisz, de 61 anos, que mandou matar o marido, o banqueiro
Gavril Weisz, em março de 1995, em Americana, interior de São Paulo, é uma das
pessoas que há mais tempo estava fugindo da polícia no Brasil.
Na época,
quem a prendeu e entregou à Justiça foi o próprio Brochi, então um jovem
investigador em início de carreira. Oito meses depois, houve um resgate de
presos na Cadeia de Sumaré, no interior, e Lúcia fugiu. Ela nunca mais foi
achada. Desde a fuga, Brochi passou a buscar a foragida. “Não poderia esquecer
este caso, não só porque ela matou o marido e destruiu a vida do filho. É que,
ao simular um assalto em sua casa, uma viatura da Guarda Municipal que seguia
para o local acabou batendo em um caminhão.”
Segundo
Brochi, o acidente aconteceu próximo da casa supostamente assaltada - o roubo
foi simulado para encobrir o assassinato de Wiesz pela mulher. “O GM Antunes -
nunca me esqueci do nome - morreu nesse acidente e deixou três filhos pequenos.
Ela foi a causa indireta da destruição também dessa família. Jurei a mim mesmo
fazer de tudo para prendê-la outra vez”, diz o investigador.
O policial
explica por que demorou tanto para conseguir a nova prisão.
“Normalmente,
depois de algum tempo, o fugitivo tenta se reaproximar da família e vai
relaxando, fica menos cuidadoso. Com ela foi diferente, pois conseguiu ficar
esse tempo todo quase sem deixar rastros, como um fantasma. Era como se ela não
existisse.”
Embora tenha
mantido a mesma identidade, Lúcia se isolou por completo, distanciando-se até
do próprio filho que, na época do crime, tinha apenas 11 anos e foi criado por
uma tia. O agente conta que, inicialmente, foram feitas buscas nos possíveis
esconderijos, casas de parentes e amigos, e nada. Depois, com intervalos de um
a três meses, em razão das outras atividades policiais, ele procurava fotos ou
sinais da mulher em bancos de dados.
“Não tive
satisfação em ver aquela mulher, que já poderia ter acertado as contas sendo
presa. Foi perseverança, vontade de cumprir meu dever.”
Adinei
Brochi, investigador da Polícia Civil
“Vi que não
seria uma tarefa fácil. Ela não tinha telefone fixo, celular, computador, conta
em rede social, nada que pudesse ser rastreado. A única coisa que a ligava ao
passado, o que só soubemos depois, era a conta bancária em que recebia a pensão
de viúva deixada pelo marido morto.”
A conta foi
aberta em um período em que os serviços bancários não eram informatizados. A
busca também ficou difícil porque ela mudou muito de endereço. Além do Paraná,
Lúcia morou em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e em cidades do interior de São
Paulo, como Araçatuba e Guararapes. “Ela alugava casas simples, diretamente com
o dono, sempre de forma muito discreta. Saía de casa uma vez para sacar o
dinheiro a fazer compras básicas.”
Ele conta
que, há cerca de 15 anos, Lúcia ficou doente e se reaproximou do filho que, até
então, não voltara a ter contato com ela. A viúva foi morar em Ponta Grossa, a
cidade onde o rapaz reside, mas em outra casa. “O filho passou a vê-la, mas de
forma muito cuidadosa, tomando toda a cautela para não ser seguido, tanto que
nem a mulher dele sabia do que se passava. Ela tinha pouco contato com os
vizinhos, era considerada pouco sociável.”
Desafio
Apesar de
considerar a mulher “quase irrastreável”, Brochi nunca pensou em desistir. “Era
como se fosse um desafio, estava com aquela coisa enroscada. Ela tinha uma
conta para pagar com a sociedade, mas estava solta. Outros acusados foram
condenados e cumpriram as penas, estão em liberdade há vários anos.”
Nos últimos
seis meses, as pistas esquentaram e o paradeiro de Lúcia foi descoberto. Após
tanto tempo, Bochi não quis correr riscos. “Não tivemos pressa, pedimos o apoio
à polícia de Maringá e fomos monitorando seus movimentos. No dia da prisão,
sabíamos que ela ia até a agência sacar a pensão. Foi só um tempo de espera até
ela surgir.”
Ao bater o
olho na mulher de pele clara e olhos azuis, bastante envelhecida, ele não teve
dúvida de que estava frente a frente com a viúva. “Ela me conheceu muito jovem
e hoje sou um policial velho, com barba grisalha. Mas acho que ela envelheceu
mais do que eu.”
Segundo
Brochi, ela não reagiu. “Quando disse que ela tinha uma conta a pagar com a
justiça, ela falou que estava à disposição. Pareceu até aliviada, pois em todos
esses anos, teve uma vida de reclusa. Uma pessoa pode fugir da polícia por um
longo tempo, mas não pode se esconder para sempre. Um dia o pesadelo se torna
real.”
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