Nesta
segunda-feira (30), por exemplo, no Senado Federal, religiosos participaram de
uma sessão especial, com a presença do coral da Igreja Presbiteriana de
Brasília. A Câmara Municipal de Juiz de Fora, em Minas, fez uma sessão solene
também. E um culto na noite desta segunda na Igreja do Nazareno Central de
Campinas, São Paulo, reuniu fiéis das igrejas luterana, presbiteriana,
metodista, batista e anglicana.
O centro
mundial dessas celebrações é Wittenberg, o vilarejo alemão onde nasceram as
ideias que provocaram a maior divisão da história do cristianismo.
No século
XVI, em um tempo em que as mentes humanas se iluminavam depois da Idade Média,
o monge alemão Martinho Lutero se uniu a outros pensadores da Europa e
denunciou os abusos que vinham sendo cometidos pela Igreja Católica à qual ele
também pertencia.
Usou de uma nova tecnologia, a imprensa, para multiplicar seus escritos e
fazê-los percorrer a Alemanha e o mundo. Traduziu a Bíblia para o alemão e
conseguiu acabar com as missas em latim para que as pessoas pudessem finalmente
entender o que os pregadores diziam.
Lutero era
revolucionário, mas não rompia completamente com a tradição cristã. Acreditava
no "terrível poder do diabo", pensava ser justo e necessário matar as
bruxas nas fogueiras, e acreditava profundamente nas ideias do apóstolo Paulo,
afirmando que "o justo viverá da fé", querendo dizer que "a
vontade humana não é livre para fazer o bem", porque, Lutero dizia,
"não existe livre-arbítrio; o homem às vezes busca o que é bom e nobre,
tenta se aproximar de Deus, mas age por culpa e egoísmo”.
No entendimento de Lutero, é Deus que torna um homem bom ou justo, e a salvação
só existe com uma experiência pura de fé em Cristo. Os reformadores queriam
acima de tudo "sola scriptura", ou seja, fidelidade absoluta ao que
dizem os evangelhos. Daí terem sido chamados de evangélicos ou protestantes.
Doutor Lutero, como era conhecido por causa da formação acadêmica, vivia em um
antigo convento em Wittenberg. O interessante desse ambiente é que ele nos faz
voltar no tempo e imaginar o que acontecia ali quando Lutero se reunia com
estudantes, trabalhava, escrevia e, principalmente, pensava sobre a reforma que
ele estava fazendo no mundo cristão.
No dia 31 de outubro de 1517, 500 anos atrás, em uma porta na entrada da igreja
do castelo de Wittenberg, Lutero pregou seu grande manifesto: um documento com
95 afirmações profundamente críticas à venda de indulgências pela Igreja
Católica. Religiosos concediam o perdão divino em troca de dinheiro ou de bens
dos fiéis. Eram pessoas que queriam pagar por seus pecados ainda aqui na Terra
pensando que, com isso, garantiriam a entrada no reino dos céus. Mas Lutero
entendia que, de acordo com as escrituras, isso jamais seria possível.
Em uma das
teses mais duras pregadas na porta da igreja, Lutero afirmava que os religiosos
que vendiam perdão estavam pregando "doutrinas humanas que dizem que assim
que o dinheiro entra no cofre a alma sai voando do purgatório".
Por fim, Lutero atacava também a riqueza acumulada pelo Vaticano. "Os
verdadeiros tesouros da Igreja, de onde o papa distribui indulgências, não são
suficientemente discutidos ou conhecidos pelo povo de Cristo", ele dizia.
Por causa do
ato de Lutero, a Igreja do Castelo, que também é conhecida com a Igreja de
Todos os Santos, se tornou um marco do começo da Reforma Protestante. E até
hoje, principalmente agora, nas celebrações dos 500 anos, pessoas do mundo
inteiro vão até lá prestar homenagens ao homem que ousou desafiar a Igreja
Católica num tempo de trevas e acabou mudando os rumos da história.
O monge
alemão entrou em uma disputa tão perigosa com a Igreja que precisou passar um ano
escondido em um castelo.
Quando
voltou a Wittenberg, não mais católico, ele rejeitou a ideia de que padres
deveriam ser celibatários e se casou com uma freira que abandonou o convento.
Passou a criticar o que dizia ser um excesso de sacramentos e dogmas impostos
pela Igreja. Foi repreendido pelo Papa, mas jamais se desculpou.
Voltando ao
que se entendia serem as origens do cristianismo, surgiram as igrejas
luteranas, presbiterianas e muitas outras denominações, que mais tarde
chegariam também ao Brasil.
A Igreja
Católica sentiu o golpe e viu uma debandada de fiéis. Muitos protestantes foram
perseguidos e algumas décadas depois veio uma guerra terrível pela Europa. De
um lado nações católicas, do outro, protestantes.
Em termos
religiosos, a reação do Vaticano veio
no Concílio de Trento, em 1545. Foi quando começou a chamada Contrarreforma,
uma tentativa católica de recuperar os fiéis perdidos.
Só cinco
décadas depois daquele 31 de outubro de 1517, a venda de perdão, a venda de
indulgências, foi proibida pelo Vaticano. As feridas entre católicos e
protestantes jamais foram completamente curadas. Ainda que, recentemente, e
muito lentamente, venha surgindo um movimento de reaproximação.
Assista ao vídeo da reportagem completa
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