Felipe Nunes menciona o voto econômico – a ideia de que o eleitor premia o incumbente quando a economia vai bem e o pune quando vai mal – para argumentar que os ganhos da sociedade com os programas sociais passaram a ser vistos como direitos básicos. Apesar de concordar com ele nesse ponto, não vejo isso como o fim da teoria do voto econômico. É essencial lembrar os detalhes dessa teoria, incluindo quando a avaliação sobre a economia importa e como o viés partidário influencia essa percepção.
Especialistas em ciência política defendem que o desempenho econômico no ano eleitoral – e até mesmo nos últimos três meses antes da eleição – tem mais impacto sobre o eleitor do que a performance do presidente ao longo de todo o mandato. Por esse motivo, o eleitor tende a ser “míope”, ou seja, avalia apenas uma fração do desempenho do governante em vez de considerar todo o período de governo.
No seu atual mandato, Lula tem repetido uma estratégia que já funcionou no passado: aumentar o salário mínimo e investir em programas sociais voltados para a redução da pobreza, como o Bolsa Família. No entanto, a alta nos preços de alguns alimentos tem corroído esses ganhos sociais, afetando especialmente a população de baixa renda e os nordestinos – dois grupos historicamente alinhados ao presidente, mas que agora demonstram sinais de insatisfação.
De acordo com a tese do voto econômico, Lula ainda tem tempo para recuperar sua popularidade e vencer a eleição de 2026. O eleitor só avaliará de fato seu desempenho à frente da Presidência no próximo ano. A ideia do “fim da gratidão” é questionável à luz da teoria do eleitor míope, que destaca a influência dos fatores econômicos de curto prazo na avaliação dos governantes.
Se o eleitor brasileiro for míope, a queda na popularidade pode ser menos estrutural do que Nunes sugere e mais relacionada a fatores momentâneos, como o aumento dos preços, a disseminação de fake news sobre o PIX e a percepção de descontrole inflacionário.
Outra variável relevante é o viés partidário. Estudos mostram que a percepção da economia dos eleitores está diretamente ligada à sua identidade partidária. No Brasil, onde o PT tem sido o partido predominante desde a redemocratização, a competição eleitoral se estrutura em dois polos: petismo e antipetismo. Dessa forma, os antipetistas tendem a superestimar os problemas econômicos, enquanto os petistas avaliam positivamente a situação econômica, independentemente dos indicadores objetivos, como PIB, inflação e desemprego.
Em um cenário de polarização afetiva – no qual a identificação com um grupo cresce na mesma proporção que o antagonismo ao grupo rival –, os eleitores brasileiros passaram a enxergar a política por meio de bolhas ideológicas. Esse fenômeno reforça laços partidários e influencia a percepção da realidade de acordo com a filiação política. Assim, a queda na popularidade de Lula não significa necessariamente que seus eleitores estão menos fiéis ou mais críticos.
Nesse sentido, a atual polarização política pode até favorecer Lula na recuperação de sua base de apoio, especialmente entre mulheres, nordestinos e eleitores de baixa renda – segmentos tradicionalmente alinhados ao PT. A queda na popularidade deve ser momentânea, e não estrutural.
A frustração econômica levou alguns eleitores a uma deserção temporária, mas isso não significa que abandonarão o presidente na eleição. Caso deixem de apoiá-lo, a tendência é que votem em branco ou nulo, em vez de migrarem para a oposição.
Para vencer, Lula precisa reacender a esperança entre sua base. E, nesse processo, a economia será o fator decisivo.
André Bello
Pós-Doutor IPOL/UNB e UFMG
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